Da conversão de Francisco de Assis
Mas, embora em seu coração vigorasse continuamente este pequeno fogo do amor divino, sendo ele ainda um adolescente envolvido pelas cuidados terrenos, ignorava o arcano da palavra divina, até que, pousando sobre ele a mão do Senhor (Ez 1,3), foi castigado exteriormente pelo peso de longa doença e interiormente iluminado pela unção do Espírito Santo” (Legenda Menor de São Boaventura).
Ao tratar da conversão de São Francisco no início da Legenda Menor, São Boaventura relembra o processo conversivo do santo. Um aspecto interessante apresentado no texto é a doença que aparece em seu caminho. Ela tem uma função. “a mão do Senhor”. Deus quer a doença? Poderíamos perguntar. Sim e não. Ele não quer que seus filhos sofram, porém as escolhas errôneas levam indubitavelmente à elas. E nesse caso, o que é ruim – a doença – pode ser momento de conversação. Nesse sentido ela pode ser ‘boa’.
A doença aparece como sinal. Possibilidade de mudança. Poderíamos dizer: parada para a reflexão. A partir desse momento, Francisco de Assis começa a voltar mais detidamente para o Senhor. O mal – a doença – se transformou em bem, em encontro. Tal processo não pode por nós ser fantasiado. Ao falamos dessa enfermidade, em momento nenhum podemos entende-la como boa de se “sentir”. É dor mesmo! É mal-estar mesmo! Falamos isso para que superemos algumas concepções atuais de uma espiritualidade anêmica que diz sim para a cruz de Cristo e vive o não ao crucificado.
Por graça de Deus, Francisco inicia uma nova etapa em sua vida. Começa a conhecer melhor a Deus e seu modo de operar. Talvez por isso, tendo descobrindo durante sua enfermidade a possibilidade de encontro, de meditação e reflexão, as dores e cruzes se tornam até mesmo desejáveis. Em nossa concepção usual, isso é loucura ou tido como doença. Porém, parece que assim entendeu o santo de Assis e trilhou os mais altos cumes da santidade como os abismos do humano.