Carta Exortação
Aos irmãos franciscanos aos quais chegarem esta carta, Deus abençoe e dê saúde a todos.
É nosso dever diário abraçar o Cristo crucificado e fazermos a mesma pergunta que nosso Seráfico Pai fez: “Senhor que queres que eu faça?” (AP 6) e estarmos dispostos a ir e fazer a vontade de Deus.
É desejo manifesto de São Francisco de Assis que todos os irmãos cultivem o temor a Deus honrando, louvando e bendizendo em todo o tempo (1Fr 59). É por isso, irmãos e irmãs, diletos filhos e filhas do Deus Altíssimo, que devemos cuidar com grande zelo em não nos afastarmos de nosso Criador, pois, em todo momento, o mal quer sufocar o coração do homem para não praticar os preceitos do Senhor. “Esforcemo-nos por amar, servir e adorar o Senhor Deus com o coração limpo e com a mente pura e façamos sempre [do nosso coração] uma habitação e um lugar de repouso para Ele que é o Senhor Deus Onipotente” (1Fr 15-16).
Lutemos, meus irmãos, para preservarmos a pureza, esta preciosa essência que exala de nossa alma e que nos é sugada a cada dia pelo pecado. Por isso, devemos entregar nas mãos de Deus nosso corpo e nossa alma para que, com sua ajuda, possamos resistir às perseguições. O Espírito Santo nos envia seus dons na hora do combate, pois sem Deus somos fracos e só nos restam os vícios e os pecados. Essa entrega se dá também através da confissão, pois rasgamos nosso ser e oferecemos tudo o que somos a Deus (Tg 5,16). Fiquemos atentos para não fraquejarmos ou irarmos com Deus diante das doenças. Cuidemos para não desanimarmos e vivermos murmurando diante de nossas limitações físicas e no definhar do corpo. Aprendamos com as intempéries corporais e não permitamos que estas, venham por desassossegar nossa fé e desequilibrar nossa paz, mas as compreender e aceitar como Francisco de Assis.
Busquemos sempre a Palavra, porque a Palavra é que nos orienta e gera mudança em nossa vida, mas para que possa gerar frutos ela precisa ser semeada. E esse fruto gerado precisa ser a mudança em nossa vida. Portanto, busquemos com amor e simplicidade viver a vontade de Deus, sendo instrumento em suas mãos.
Irmãos e irmãs em Cristo Jesus, o acolhimento do outro como dom faz da nossa espiritualidade uma vivência comunitária que vai ao encontro do irmão (Test. 14), nos colocando a serviço em suas necessidades (2Fr 7). “Devem os irmãos cuidar uns dos outros espiritual e diligentemente e honrar uns aos outros sem murmuração” (2Fr 15).
Todos nós “devemos alegrar-nos quando estivermos entre pessoas insignificantes e desprezadas, entre os pobres, fracos, enfermos, leprosos e os que mendigam pela rua” (1Fr 74). A dedicação aos irmãos e irmãs mais necessitados nos ensina a perceber a nossa fragilidade humana e a reconhecer no outro as nossas limitações. O ser irmão menor é perceber e compreender que todas as criaturas estão enraizadas em seu Criador, o Deus altíssimo. Com isso, o servir como irmão menor é servir o outro em suas necessidades de base e fundamento. É perceber que todos nós precisamos do mesmo cuidado e dos mesmos nutrientes para sobreviver e poder frutificar. Enfim, é pensar no outro como parte de nós.
Vivendo no mundo moderno, com pessoas cada vez mais possessivas e individualistas, resultado do capitalismo que transformou nossas relações, viver os desapegos propostos pelo Evangelho é um desafio cada vez mais urgente e também delicado. No entanto, é um dever franciscano não se adaptar aos bens nem ministérios, a exemplo do próprio Cristo que “sendo Deus, não se apegou à sua condição divina, mas se despojou, tomando a forma de escravo” (Fp 2, 6-7). A todos nós, tomemos cuidado para que não caiamos nas desilusões dos títulos poderosos, mas havemos sempre de ansiar pelo título da plena sabedoria de Deus. Não sejamos nós, principalmente os mais novos que por admiração ao irmão mais velho em estudo, a almejar títulos grandes de mestrados e doutorados por aparência de grandeza mundana, mas estudemos para crescer na ciência do Espírito Santo.
Na vida Franciscana é imprescindível a prática da caridade, pois a fé sem obras é morta (Tg 2, 17) e também deve-se tomar cuidado com as glórias dos homens, afinal o Senhor diz: “Em verdade já receberam sua recompensa, mas quando tu deres esmola, não saiba a tua mão esquerda o que faz a tua direita, para que a tua esmola seja dada em secreto e teu Pai, que vê em secreto, Ele mesmo te recompensará publicamente” (Mt 6, 2-4).
Durante toda a nossa história, irmãos e irmãs menores, filhos e filhas diletos de nosso Pai, somos chamados à santidade. Somos inspirados, não somente em pregar e anunciar, mas a sermos a encarnação do próprio Evangelho no mundo atual. A transformação da nossa sociedade dá-se pela nossa autêntica intimidade com o nosso Criador. “O que oferecemos ao mundo deve ser um serviço que encontra seu fundamento na amizade com Deus” (Fr. Sílvio de Almeida, OFMCap – PROMAPA). Como nos orienta nosso Seráfico Pai: “depois que abandonarmos o mundo, nada mais devemos fazer, senão que sejamos solícitos em seguir a vontade do Senhor e agradar-lhe; cuidemos muito para não sermos terra à beira do caminho ou pedregosa ou espinhosa, segundo o que diz o Senhor no Santo Evangelho” (1Fr 6). Com isso nossos gestos, ações e palavras serão, não somente edificantes, mas transformadores e que impulsionará todos a uma ardente conversão.
Não nos esqueçam que o hábito do qual nos vestimos, não somente no corpo, mas em nossa alma, nos tornando semelhantes ao Cristo crucificado, é para o mundo luz e guia de fé. Devemos assim, a cada dia, nos transfigurar a sua imagem e semelhança, colocando em prática os seus ensinamentos e ações. Por isso, atendamos ao que nos diz o Senhor: “amai vossos inimigos e fazei o bem àqueles que vos odeiam” (Lc 6,27). Contudo, fazei isto para que a imagem distorcida revelada pelo seu irmão seja transfigurada pela imagem de Cristo e que toda a angústia e tribulação que nos causem “sejam a certeza da vida eterna” (1Fr 45)
Amados irmãos e irmãs, quando entregamos nossa vida ao Senhor Jesus Cristo devemos nos lembrar que Ele foi perseguido, flagelado, crucificado e morto, então, como fiéis seguidores de Jesus, estamos sujeitos a passar também pelo martírio. Além disso, devemos ser felizes e alegres nas provações que Cristo nos concede, pois outrora Ele mesmo disse: “Eu corrijo e castigo aqueles que amo” (Ap 3,10).
Paz e Bem!
(Foto: Jhorchua, Matheus, Wellington, Rafael, Taynan e Túlio)
Texto produzido pelos postulantes capuchinhos (BC) no dia 04 de setembro de 2019, tendo como inspiração os Fragmentos da Regra não Bulada das Fontes Franciscanas.