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Nole mi tangere!

Publicado por Frei Vanildo Luis Zugno | 21/07/2020 - 10:32

Nole mi tangere!

Dia 22 de julho a Igreja celebra Santa Maria Madalena. E o faz com uma festa. Dentro
das categorias litúrgicas, é o modo mais elevado de lembrar um santo, no caso, uma
santa. A elevação de categoria litúrgica de Maria Madalena aconteceu em 2016 por
decisão do Papa Francisco. Até então, celebrava-se apenas a memória desta mulher.
A decisão não foi uma inovação. Na Idade Média, vários teólogos, incluído Santo
Tomás de Aquino, a chamaram de “apóstola dos apóstolos”. Título mais do que
merecido pois, segundo os Evangelhos, foi a encarregada por Jesus de anunciar a
ressurreição aos outros discípulos.
Ela fazia parte do grupo dos seguidores e seguidoras do Mestre desde a Galileia.
Juntamente com Joana, mulher de Cuza, procurador de Herodes, Susana e muitas
outras, elas sustentavam o grupo com seus bens. Eram mulheres poderosas e
independentes que, contrariando as tradições e leis, abandonaram tudo para seguir Jesus.
Maria Madalena é uma das personagens mais frequentes nos evangelhos. Quatorze
vezes é citada nominalmente. Acompanhou Jesus até Jerusalém e, junto com a mãe de
Jesus e as outras mulheres, foi das poucas que presenciaram a crucificação.
Além de discípula fiel e apóstola de primeira hora, a única informação que dela nos dão
os evangelhos é que foi libertada de sete demônios. Em linguagem bíblica, era uma
pessoa que sofria muito e, no encontro com Jesus, foi libertada. De que ela sofria? Os
evangelhos nada dizem.
Por que então a tradição associou Maria Madalena a uma prostituta? É uma boa
pergunta... A primeira vez que isso aconteceu foi num sermão de São Gregório Magno,
pronunciado no ano de 591 d.C. No sermão, o Papa confunde a Madalena com a mulher
adúltera e com a Maria que lavou os pés de Jesus com suas lágrimas. Uma indevida
ligação que que se perpetuou em sermões e obras de arte e chegou até o cinema
contemporâneo.
E mais: por que durante séculos tal associação foi aceita acriticamente? Também é uma
boa pergunta... Não sei se tenho uma boa resposta para as duas boas perguntas. Mas
tenho, no mínimo, uma suspeita: a dificuldade, tanto na Igreja como na sociedade, em
aceitar o protagonismo feminino. São Gregório Magno, em seu sermão, já deixou a

dica. Maria, a Mãe de Jesus, era o modelo de mulher submissa. Madalena, a de mulher
independente que se arrepende e passa a ser submissa.
São João Paulo II, na Encíclica sobre a Dignidade da Mulher, lembra que estamos em
outros tempos e precisamos reconhecer a dignidade e protagonismo das mulheres na
sociedade e na Igreja. Nessa mudança, é preciso ouvir das mulheres de hoje, aquilo que
Jesus disse outrora a Maria de Magdala: “Noli me tangere! Não me detenhas!” Elas
pedem passagem.

Sobre o autor
Frei Vanildo Luis Zugno

Frei Capuchinho da Província Sagrado Coração de Jesus - Rio Grande do Sul. É graduado em Filosofia (UCPel - Universidade Católica de Pelotas, RS) e em Teologia (ESTEF - Escola Superior de Teologia e Espiritualidade Franciscana, Porto Alegre, RS). É mestre em Teologia (Université Catholique de Lyon - França) e doutor na mesma área pela EST, de São Leopoldo - RS. É professor de Teologia na ESTEF e na UNILASALLE, em Canoas - RS. 

Blog pessoal, onde é possível encontrar mais textos de sua autoria: http://freivanildo.blogspot.com/