História das Missões Populares Capuchinhas no Rio Grande do Sul

As missões populares fazem parte do carisma original da Ordem Capuchinha. Os capuchinhos, no curso da história, são conhecidos como missionários. A finalidade principal da vinda dos frades capuchinhos ao Rio Grande do Sul resume-se a pregação de missões populares junto aos imigrantes italianos. Esta foi a proposta inicial e específica de Dom Cláudio José Ponce de Leão, bispo de Porto Alegre, encaminhada à província capuchinha de Savóia da França. Com possibilidade de ampliar esta atividade, atingindo também brasileiros e alemães. Frei Bruno de Gillonnay e Frei Leão de Montsapey iniciaram sua atividade missionária tão logo chegaram em Conde d’Eu (Garibaldi RS).

Na pregação seguiam os métodos empregados na França, mas a realidade brasileira os obrigava a mudanças substanciais. Durante o tempo da missão, era necessário exercer todas as funções do ministério: pregar, batizar, preparar para a primeira comunhão, celebrar a missa, ministrar a unção dos enfermos e confessar. Os missionários hospedavam-se nas casas e se deslocavam de um lugar para outro a cavalo. Em 1900, os capuchinhos fizeram a primeira tentativa de pregação de missões populares junto ao povo luso-brasileiro na área de Vacaria. 

Dom Cláudio queria os capuchinhos restritos à pregação das missões populares. A paróquia entrava no programa como eventualmente e em função da pregação missionária. Porém, com crescimento das vocações nos seminários e as dificuldades de manutenção dos seminaristas e da própria missão, pois as contribuições do povo eram escassas, consequência das intempéries e a fraca contribuição do clero ao trabalho missionário, sentiu-se a necessidade de assumir paróquias junto aos conventos, a fim de providenciar, pelo trabalho remunerado, o sustento dos frades e seminaristas. Frei Bruno lutava pela independência econômica. Ela lhe permitiria pregar missões onde fosse necessário, com mais liberdade.

As missões populares, desde a chegada dos pioneiros da França, vão adquirindo sempre maior popularidade, exigindo sempre maior organização e planejamento. Em 1907, a Missão dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul decidiu constituir o Diretor das missões populares. Isto significa que um frade fica direta e pessoalmente responsável pelas missões populares. Até 1906, a coordenação da pregação de missões populares se confundia com o diretor da Missão, na pessoa de Frei Bruno de Gillonnay.

Frei Fidélis de La Motte-Servolex foi o primeiro diretor das missões populares. Neste período começou-se a organizar uma coleção de cantos sacros em italiano, “o Lodi Sacre”, traduzido e ampliado, em 1941, com o título “Cantai ao Senhor”. Frei Gentil Giacomel em 1928 foi o primeiro capuchinho gaúcho a ser nomeado diretor das missões populares, depois dele se seguiram: Frei Antonio Bambi e Frei Afonso Lazzaretti (1939-1942). Neste período aconteceram missões populares em algumas paróquias de Porto Alegre. Neste período foi organizado “a equipe missionária”, com vários frades incumbidos exclusivamente das missões populares. Juntaram-se ao Frei Afonso, Frei Bernardino Vian, Frei Constantino Dotti. Antes disso, havia apenas a indicação do diretor que, a cada missão, recebia frades auxiliares. 

Nos anos 1942-1953 houve um grande impulso nas missões populares. Sob a direção de Frei Daniel Vian, com seis missionários passou-se a estruturar a missão com aquisição de condução para os deslocamentos, elaboração de um projeto missionário: Uma pré-missão com o objetivo de preparar as comunidades para receber a missão, era um folheto de quatro páginas, distribuído nas paróquias a serem missionadas que revelava a filosofia, os conteúdos e a organização da missão.

Em 1950, com o título: “Salva a tua alma”; foi publicado no Porto (Portugal) um livrinho com 62 páginas, destinado ao uso das missões e como lembrança da mesma. Continha as principais verdades da fé, a missa, os sacramentos, a via-sacra, as orações e as canções penitenciais e marianas. O livrinho foi compilado por Frei Bernardino Vian. Em 1954, a editora São Miguel publicou um livreto: “Lembrança da missão –Salva a tua alma” e em 1958 publicou: “Fátima, peregrina e missionária”.

Em 1946, o Frei Bernardino Vian foi enviado a Portugal com mais seis missionários. No seu retorno trouxe a imagem de Nossa Senhora de Fátima, peregrina e missionária. Com sua liderança, auxiliado pelos freis Lauro Reginato e Eusébio Ferreto, começa a organizar uma nova equipe missionária, destinada à região centro-norte do país. Constituía-se assim, em 1952, a “equipe missionária B”, coordenada por Frei Bernardino Vian praticamente até sua extinção em 1976. Esta equipe foi marcada pelo carisma de Frei Bernardino, considerado o maior missionário popular capuchinho de todos os tempos, pelos longos anos como missionário, pelo roteiro cumprido, pela singularidade apostólica com a imagem de Fátima, a Fátima dos pombinhos, tendo percorrido quase todo o Brasil.
A “Equipe Missionária A” atendia prioritariamente a região Sul, com maior número de frades. 

Antes do Concílio Vaticano II os conteúdos, em geral, constavam de: Abertura e sermões sobre salvação, alma, pecado, morte, juízo, inferno, paraíso, encerramento. O método usado era o de sermões dirigidos a todo o povo e palestras às classes (homens, mulheres, moços, moças e crianças). Moralismo, sacramentalismo, intimismo e individualismo eram marcas dessas pregações. 

Pelo ano 1970, em clima de pós-Vaticano II e Medellín, a Igreja empreendia corajosa renovação que atingia todas as instituições, enquanto a sociedade vivia na euforia da modernidade. Havia uma forte crítica a todas as expressões deformadas de religiosidade, atingia o coração das missões populares, criticadas particularmente por desencadearem uma emocionalização, mais que uma profunda conversão, caracterizadas como fogo de palha.

O cansaço dos missionários veteranos, as críticas , advindas de todas as direções, provocou forte crise interna na “Equipe missionária A”. Numa reunião dos missionários como provincial, Frei Jaime Biazus, pensou-se em suspender temporariamente as missões. Só não aconteceu devido ao amor de alguns missionários pelas missões.

A partir de então a Equipe A iniciou uma nova caminhada missionária com conteúdos e métodos novos e reforço de novos missionários. Para se adequar aos novos tempos passaram a estudar, cursos sobre tema como: missões, evangelização, moral, sociologia religiosa, encontros, troca de experiências com outros grupos missionários.

A renovação atingiu particularmente os conteúdos das pregações. A mensagem deixada na cruz, no final da missão, mudou de Salva tua alma, para “Unidos em Cristo”. Isto caracteriza mudanças de conteúdo. A conversão pessoal necessita se expressar na vida comunitária, valorização da família, inserção e participação de uma nova sociedade; catequese como processo permanente e não apenas como preparação dos sacramentos; valorização da palavra de Deus; preocupação com a realidade local. A devoção mariana passou a ser suporte e não centro da evangelização. 

A completa renovação dos conteúdos missionários, em atenção às exigências dos documentos da Igreja, planos diocesanos e paroquiais de pastoral, fizeram com que as missões recobrassem sua função de fermento, luz, vinho novo no caminho pastoral das paróquias e dioceses missionadas.

 A renovação dos conteúdos exige a renovação dos métodos. Passou-se a usar uma coerente simbologia nas pregações e celebrações: músicas, mensagens, audiovisuais e recursos técnicos como alto-falantes, gravadores, Notebook, DataShow.

A renovação de conteúdo, métodos e recursos utilizados, exigiu a renovação da estrutura das missões populares. O desenvolvimento das missões dependia muito da personalidade do diretor e sua capacidade de planejamento. Agora, o planejamento passa a ser tarefa de equipe, que estuda, reflete, planeja junto e expressa sua unidade através do ministério do coordenador. Atualmente, desde 1992, a coordenação é feita em rodízio, assim todos os missionários experimentam concretamente a realidade de uma missão. 

Pré-missão (três a quatro meses antes da missão), missão (corresponde de 3 a oito dias de presença do missionário na comunidade) e pós-missão (aproximadamente um mês após a missão, dois ou três dias na sede paroquial, para aprofundamento e vivência do conteúdo das missões; formação de lideranças na catequese, liturgia, conselhos comunitários de pastoral e juventude) é a estrutura básica das Missões Populares dos Capuchinhos do Rio Grande do Sul. 

Uma residência para os missionários não foi necessária enquanto a província destacava apenas um diretor de missões que, a cada missão, recebia auxiliares para aquela missão. O diretor residia em sua própria fraternidade. Desde que a província passou a destacar frades com tempo integral para as missões, fez-se necessário uma residência para eles. A Equipe Missionária residia, inicialmente, em Caxias do sul, na Fraternidade Imaculada Conceição; de 1960 a 1962, no Seminário Seráfico Santo Antônio de Vila Flores. Em 1963 foi construída uma residência, junto a Igreja, destinada a abrigar a Fraternidade Nossa Senhora de Fátima e à Equipe dos Missionários, conhecida como Casa dos Missionários. 

Durante uma década, os missionários integraram na equipe auxiliares leigos voluntários. Nove leigos tiveram esta oportunidade. Em 1989, por razões internas, não se convidaram mais auxiliares leigos. 

A partir de 1980, religiosas e freis capuchinhos, estudantes de teologia, integraram a equipe missionária. Em favor da convivência continuada, da reflexão e revisão permanente, também esta experiência foi abandonada. 

Em 1978 iniciou o Encontro dos Agentes de pastoral, párocos e lideranças paroquiais. Inicialmente em Vacaria, nas férias de Janeiro. Hoje se realiza em cada paróquia a ser missionada. Na ocasião os missionários são informados da realidade social, econômica, política e religiosa da paróquia e os missionários expõem o projeto das missões e encaminham alguns procedimentos para a realização da missão. 

A Rádio Fátima, hoje Tua Rádio Fátima, nasceu ligada às missões e custou muitos sacrifícios aos missionários durante longos anos. Os missionários desejavam fazer da Rádio Fátima um prolongamento de sua mensagem. Queriam constituir um tripé de evangelização: Paróquia, Rádio e Missionários. Hoje, os Missionários, mantém o programa “Voz dos missionários” que vai ao ar todos os domingos pela manhã. Muitos encerramentos de missões são também transmitidos. 

 

(COSTA, Rovílio. DE BONI, Luis A.. Os Capuchinhos do Rio Grande do Sul. Porto Alegre: EST, edições Correio Riograndense, 1996. Resumo das pg. 130 a 148.)