De 4 a 6 de julho, em Manaus, 160 franciscanos de todo o Brasil se reuniram no “Fórum Franciscano para o Sínodo Pan-Amazônico”, a fim de adentrarem mais no processo do Sínodo, já iniciado em 2018, com o envolvimento de quase cem mil pessoas no processo de consultas, assembleias e fóruns em toda a Amazônia e em outros locais, bem como aprenderem com a região amazônica, suas práticas e culturas, e refletirem a presença do carisma franciscano na região, com a temática do Fórum “perspectivas e desafios para a Conferência da Família Franciscana do Brasil”.
Eram frades, irmãs, membros da OFS e Jufra, aproximadamente metade deles atuantes e moradores na região Amazônica, os outros das várias regiões do Brasil, um participante da Bolívia e um da Argentina. Estavam presentes frades capuchinhos da Comissão JPIC dos capuchinhos de São Paulo, Paraná-Santa Catarina, Pará-Maranhão-Amapá e Amazonas-Roraima, e vários frades da Custódia Amazonas-Roraima, muitos destes envolvidos diretamente na organização do Fórum. Iniciando no dia 4 de julho com uma mística de abertura, seguida da acolhida de frei Éderson Queiroz, presidente da Conferência da Família Franciscana do Brasil (CFFB), que promoveu o Fórum, e da palestra de Dom Sérgio Castriani, arcebispo de Manaus, expondo sobre o Sínodo Pan-Amazônico. Ele destacou ser um processo sinodal, que se iniciou com todas as “escutas” em 2018, para “conhecer, reconhecer, conviver e defender” a Amazônia, e que terá, em outubro de 2019, a Assembleia dos bispos em Roma, junto ao Papa, para delinearem, a partir da escuta da realidade amazônica, “novos caminhos para a Igreja e por uma ecologia integral, na Amazônia” e que trará luzes também para toda a Igreja. Dom Sérgio ressaltou urgir passar de uma “Igreja de visita para uma Igreja de presença” e ser “perigoso um Sínodo, porque se escuta o povo”, que provoca as estruturas eclesiais a serem mais evangélicas e inculturadas. O “rosto amazônico”, que ressalta o Sínodo, ele diz ser o rosto feminino leigo, o mais atuante na Igreja amazônica, que só precisa ser mais reconhecido; e há uma ênfase nos povos indígenas por serem os mais abandonados, inclusive nas cidades.
Seguiu padre Justino Sarmento Rezende discorrendo sobre o “Sínodo na perspectiva dos amazônidas”. “O principal agente da inculturação da fé é o próprio povo”, disse, necessitando reconhecer as teologias dos povos amazônicos, com vocações autóctones, e repensar a inculturação do carisma e presenças franciscanas na Amazônia a partir desta ótica. À tarde, o frei capuchinho Luiz Carlos Susin abordou a Amazônia à luz da Encíclica Laudato Si’ e do franciscanismo, destacando, por exemplo, a maior parte do desflorestamento da Amazônia ser hoje para soja e pastagens para gado (70 milhões de cabeças de gado na Amazônia), o que requer de nós um compromisso de reduzir o consumo de “carne”, suprindo por grãos, pois o Brasil está voltando a ser “uma grande fazenda para fora”. Como franciscanos temos uma “sensibilidade comum”, da bondade, do cuidado, da inclusão, que necessita vir junto do “desapego”, da “perda de noção de propriedade” que devasta, explora e mata, como sinal e caminho para a sociedade hoje desesperada em acumular por medo em não ter para consumir, enfatizou o frei.
Em seguida, frei João Messias (OFM) testemunhou sua vivência com os Munduruku. Uma Experiência missionária na Prelazia de Itaituba com mais de 58 comunidades indígenas, que vivem com relação de pertença com a Floresta, mas ameaçados pela extração de minérios e outros impactos socioambientais. Também a Irmã Clarice Barri, Catequista Franciscana, falou sobre mobilidade humana em Assis Brasil (AC), na fronteira de Brasil, Bolívia e Peru. Finalizamos, com a celebração eucarística e uma apresentação de balé com temática regional.
No dia 5 de julho, pela manhã, frei Atílio Battistuz, missionário na Amazônia há anos (hoje no Marajó), abordou “mística e profecia franciscanas”, disse a Amazônia estar em risco, com seus 300 povos e 1/3 das florestas originárias do Planeta, e nós brasileiros com uma mentalidade “imperialista”, destrutiva, e questionou ao público “se a Amazônia perecer, todos nós pereceremos. Mas ela irá se reconstituir um dia. E nós?”. Recordou que a última liberação de CO2 como hoje foi há 55 milhões de anos e a Terra levou 200 mil anos para voltar ao equilíbrio (teve aumento de 5º C nesta emissão). Se continuar o aquecimento global como está hoje, há previsões que daqui 100 anos só os pólos serão habitados! A Amazônia tem um solo muito frágil, e está em risco. É território disputado: por um modelo predatório e extrativista e pelo modelo socioambiental. A floresta em pé é mais lucrativa que derrubada, em pé gera anualmente cerca de US$ 700 bi, pelo abastecimento de água, regulação climática e fornecimento de alimentos nativos. A floresta é resistente, mas a agressão hoje tem sido por todos os lados. Nos últimos 40 anos foi mais de 20% desflorestada, se chegar a 40%, dizem os cientistas, é irreversível e a floresta amazônica entra em colapso!! De 2005-2014 vinha reduzindo o desmatamento, mas em 2019 está crescendo terrivelmente! E 80% do desmatamento é para pecuária (soja, pastagens…), enquanto a produção do açaí, por exemplo, é muito mais lucrativa [parece haver outros interesses juntos, como no subsolo – para a mineração, por exemplo]. Precisa-se escutar os povos indígenas que têm sabedoria e o “bem-viver”. E a presença da Igreja Católica na Amazônia está enfraquecendo muito, “em ruínas”, comunidades com 10 anos sem missionários e com a entrada de “evangélicos colonizadores” (como no Peru). Necessidade de fortalecer a pluralidade de ministérios leigos! Por fim, o frei reforça: “amazonizar” o mundo, que precisa conhecer a Amazônia para defendê-la (ao invés de internacionalizá-la), e “sinodalizar”, processo participativo, considerando aos vozes de todos no caminhar da Igreja. E ele sugere: Visitas e experiências na Amazônia (de pelo menos 1 mês); criar laços afetivos com a Amazônia; trazer a Amazônia para o debate, com os impactos e destruições vigentes; participar mais da REPAM (franciscanos ainda muito ausentes); conhecer os fundamentos e estudos dos cientistas; ouvir os povos da floresta; limitar o consumo de energia – cientistas afirmam até que a economia mundial tem de decrescer, para controlar os sérios impactos; reativar o Sinfrajupe (na Amazônia); mapear a presença franciscana na Amazônia; trabalho em rede; mudanças no estilo de vida, reduzir o consumo de carne, nenhum cálice de ouro (1 g de ouro é 1 ton de entulho). Logo após, continuou frei Florêncio Vaz (OFM) a falar sobre a “ecologia integral franciscana”, com a contribuição de vários indígenas presentes. À tarde, os participantes tiveram um contato mais direto com a fauna e a flora amazônida e, à noite, a celebração eucarística no Santuário Nossa Senhora da Amazônia.
No sábado, 6 de julho, a celebração, muito profunda, e os compromissos a partir deste Fórum se deram no encontro dos rios Negro e Solimões, na celebração no “encontro das águas”. Aconteceu numa cumplicidade com a “seiva vital” que é o rio, na relação de amor, cuidado e pertença dos indígenas e ribeirinhos com o bioma amazônico, e em profunda comunhão com o carisma de Francisco de Assis, irmão universal de toda criação e das mais frágeis criaturas, e da voz e testemunho de Francisco de Roma, de que “tudo está interligado” (LS 117) e que propõe uma conversão ecológica integral, com a conversão pastoral, ecológica e sinodal a toda Igreja!
Os materiais disponibilizados e a Carta Compromisso do Fórum em http://jpic.capuchinhos.org.br/blog/franciscanos-do-brasil-em-forum-sobre-sinodo-pan-amazonico/
Fonte: Capuchinhos do Brasil /CCB
Por Frei Marcelo Toyansk (Conferência CCB)