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Homilia do XXXII Domingo do Tempo Comum - ano A - Frei João Santiago

Publicado por Frei João de Araújo Santiago | 07/11/2020 - 09:36

XXXII Domingo do Tempo Comum - (Mateus 25, 1-13)

- “Então o Reino dos céus será semelhante a dez virgens, que saíram com suas lâmpadas ao encontro do esposo” (v. 1).

A vida humana, o nosso peregrinar nesta terra entre tantos sonhos, projetos, afazeres, circunstâncias, realizações, será sempre como um noivado, como uma saída para uma grande novidade, como uma ida para um maior encontro, como um desfecho, um ir ao encontro do esposo, queira ou não. Oxalá, vivamos a vida como um caminhar rumo a uma realização de tudo aquilo que desejamos de bom, de bonito e do mais verdadeiro que possa existir: adentrar nos aposentos do esposo, o nosso Deus.  

- “Cinco dentre elas eram tolas e cinco, prudentes” (v. 2). Tolas somos quando não fazemos a vontade do Pai, quando somos preguiçosos no espírito, vivemos em apatia, sem bom empenho na vida, quando traímos a nós mesmos e aos irmãos. Cf. Mt 7, 21). Prudentes somos quando vigiamos a fim de que nossos bens não sejam roubados, quando nos empenhamos com afinco em realizar a vontade do Pai, nosso desejo mais íntimo. Cf. Mt 25, 34-36.

 - “Tomando suas lâmpadas, as tolas não levaram óleo consigo. As prudentes, todavia, levaram de reserva vasos de óleo junto com as lâmpadas” (vv. 3-4).

A lâmpada sou eu mesmo no meu corpo. Quando meu corpo é cheio de Espírito Santo, cheio de amor, de boas práticas, eu estou iluminado, e estarei sempre iluminado. Vale lembrar que o decisivo não é tanto o encontro final, mas se eu, agora, tenho reserva de óleo comigo. O encontro com o esposo pode acontecer, mas vai depender de como eu estou indo, a partir de agora, ao encontro.  Perguntemo-nos: estou indo com sabedoria ou não, com óleo ou não?

- “Tardando o esposo, cochilaram todas e adormeceram. No meio da noite, porém, ouviu-se um clamor: Eis o esposo, ide-lhe ao encontro. E as virgens levantaram-se todas e prepararam suas lâmpadas. As tolas disseram às prudentes: Dai-nos de vosso óleo, porque nossas lâmpadas se estão apagando. As prudentes responderam: Não temos o suficiente para nós e para vós; é preferível irdes aos vendedores, a fim de o comprardes para vós. Ora, enquanto foram comprar, veio o esposo. As que estavam preparadas entraram com ele para a sala das bodas e foi fechada a porta” (vv. 5-10).

Porque o esposo tarda, posso cochilar e dormir. Mas isso não é tão importante, pois o que importa de verdade é viver tendo o reservatório ou o vaso cheio de óleo a fim de que o encontro com o esposo aconteça. Um dia, dormirei, falecerei, o novelo terminará, darei “adeus” a esta vida, terei a chance de encontrar o esposo. Encontrarei a porta fechada ou aberta?

Enquanto eu dormirei, o noivo chegará. Mas isso não é tudo! Eu terei que ir ao seu encontro, percorrer um caminho, fazer a minha parte. A morte não é tudo, não é o final de tudo, pois pode ser a hora oportuna para o encontro com o esposo; pode ser a melhor das ocasiões ou a pior delas.

Ao dormir, o noivo chega. Nesta ocasião eu me levantarei com minha lâmpada, ou seja, com todo o meu corpo, com tudo o que fiz, pensei, decidi, julguei e falei durante a vida. Levantar-me-ei com minha identidade. A minha lâmpada, e tudo o que ela significa, me levará ao encontro do esposo ou terei feito, pensado, decidido, julgado e falado sempre na contramão do esposo?

Caso eu seja como uma virgem imprudente ou tola darei conta de não carregar comigo o óleo necessário para adentrar na casa do esposo. Não tem jeito: no final cada um se verá com nitidez, se verá como sempre foi. Uma pessoa tola ou imprudente parecerá como uma vasilha vazia, sem óleo, e provavelmente se perguntará: por que ou para que eu vivi se pouco de válido eu deixei e criei? E tristemente assistirá sua lâmpada ir se apagando.

Eu que leio ou ouço a parábola das dez virgens sou convidado ao agora, ao hoje, pois a vida é curta: que eu esteja enchendo de óleo o reservatório de minha lâmpada.

Eu vivo o presente para adquirir o “óleo”. Amanhã será sempre tarde. “O ontem já era”, já passou. Um dia haverá um “tarde demais”, haverá falta de tempo, a porta se fechará. A “Palavra” serve para nos dar conta de tal realidade, antes de ter que dar conta quando será tarde demais. A “Palavra”, a presente parábola, foi escrita para nos chamar a atenção, para nos responsabilizar diante de nossa ida ao encontro do esposo. A “Palavra” deixa claro que o “jogo” já tem suas regras: não adiante ficar esperando para ver o que vai acontecer depois, pois “depois”, fecha, a porta fecha, e será tarde demais para adquirir aquilo que deixa nossas lâmpadas acesas, pois “tempo” não teremos mais.

- “Mais tarde, chegaram também as outras e diziam: ‘Senhor, senhor, abre-nos!’ Mas ele respondeu: ‘Em verdade vos digo: não vos conheço!’” (vv. 11-12).

A virgem tola que chega tarde demais e que não entra na casa do esposo é aquela que não foi conhecido pelo esposo, uma vez que o esposo não tinha sido bem recebido por ela (cf. Mt 25, 41-43). A virgem tola certamente consumiu seus dias diabolicamente, isto é, dividindo-se dos outros, dividindo os outros, lacerando-se em intrigas, preguiça, egoísmo, vinganças, ferindo-se, não se amando e nem querendo bem a tantos. E, assim, a virgem tola teceu sua existência nas trevas, sem aquele “óleo” que poderia gerar luz, transfigurá-la, fazê-la filha da Luz, esposa do esposo.

Vigiai, pois, porque não sabeis nem o dia nem a hora” (v. 13). Posso viver eximindo-me de qualquer bom empenho em favor da minha pessoa e em favor do irmão. Viverei na estupidez e na apatia. Importa vigiar. Vigiando vemos que todo dia é o dia, toda hora é a hora para comprar este óleo a fim de não se vê com lâmpadas sem óleo. Trata-se de viver atentos em portar-se de modo tal que a nossa vida não seja priva do Espírito do amor de Deus.  Caso contrário, teremos levado a nossa própria vida à falência. Somos capazes de vigilância: todos nós recebemos o dom da luz, do discernimento, da maturidade, da sabedoria, da responsabilidade.  A vida presente é determinante para comprar este óleo que é o Espírito. Vigiar é viver em comunhão com Deus, em encontrando o esposo.

Sobre o Esposo falado na parábola. Carregamos e levamos conosco o desejo de uma perene alegria. As pessoas que amamos nos lembram dessa alegria e por isso gostaríamos de estar para sempre pertinho de nossos queridos. O amor se encarnou entre nós, conhecemos sua face, suas palavras e gestos: é Jesus de Nazaré. Ele é o esposo da humanidade. Não o percamos de vista, por mais que o mundo queira tirar ou roubar nossa atenção. Amemos, portanto, a Ele. Só Ele pode nos plenificar e impedir que amemos pouco: “Olho nenhum viu, ouvido nenhum ouviu, mente nenhuma imaginou o que Deus preparou para aqueles que o amam” (1Cor 2, 9).

Sobre o óleo. Importa ter óleo na vida, praticar a Palavra, sair de uma vida frívola, vazia, mesquinha, egoísta e egocêntrica. “Deem e será dado a vocês: uma boa medida, calcada, sacudida e transbordante será dada a vocês” (Lc 6, 38). Que os nossos talentos, capacidades e dons promovam a alegria, a realização, a fé, a esperança e o amor em tantos corações. Tenhamos óleo em nós mesmos, tenhamos consciência do momento presente e consciência de que minha eternidade se decide agora.

Com a morte, a vida não termina, pois começa um grande encontro com o esposo, ou o mais terrível dos desencontros: “Não te conheço!”.

Sobre o autor
Frei João de Araújo Santiago

Frade Capuchinho, da Província Nossa Senhora do Carmo. Licenciado em Filosofia, Bacharel em Teologia e Mestre em Teologia Espiritual. Tem longa experiência como professor, seja no Brasil, como na África, quando esteve como missionário. Por vários anos foi formador seja no Postulantado, como no Pós Noviciado de Filosofia. Atualmente mora em Açailândia-MA. Já escreveu vários livros e muitos artigos.